segunda-feira, 23 de abril de 2012

LIBERTAS QUAE SERA TAMEN

         
         Oh liberdade! Abre as asas sobre nós! Para nenhum outro estado a inconfidência tem tanto valor quanto para nós mineiros.  Mora no peito mineiro eternamente esse sonho de liberdade. Esse brilho que encanta o resto do país. Ostentamos com orgulho nossa bandeira que clama por liberdade, ainda que tardia. Mesmo que possa parecer conservador, o mineiro sabe direitinho o valor dessa palavra e o quanto custa a ausência dela. Acho que carregamos mesmo sem saber um pouco desse legado histórico como se todos tivéssemos visto Tiradentes sendo arrastado pelas ruas.

           Por falar na bandeira de Minas, mas do que um grito de liberdade, ela é também um símbolo generoso de hospitalidade. Onde quer os inconfidentes reconhecessem o símbolo de sua revolução sabiam que podiam chegar pois ali, havia um amigo pronto a causa da liberdade. Isso sempre me emociona. Existem poucos símbolos oficiais tão fortes.

          Afinal, estamos libertos ou nos tornando cada vez mais escravos? Libertos pela tecnologia ou aprisionados pela mecanização que substitui mãos por botões? Livres pelo acesso a informação ou condenados a uma enxurrada de notícias sem conteúdo? Livres pelo mercado ou algemados ao consumismo? Livres para usar nosso corpo ou cativos a  molda-lo aos padrões estéticos da ocasião? Livres pela democracia ou condenados ao eterno desinteresse pelas coisas coletivas? Livre para ouvir músicas sem censura ou condenados ao tchê tcherere tchê tchê?

            Não sei as respostas. Mas o fato é que a cada dia surgem novas prisões. Cada qual tem suas próprias prisões. As contas podem aprisionar. O dinheiro pode escravizar. A inveja é uma bola de ferro amarrada ao pé. O pessimismo é uma cela. A dependência química é um cárcere. A dependência emocional é uma forca. A fofoca é uma guilhotina. Todos nós temos nossas prisões e nem sempre as reconhecemos.

           É hora de liberdade! Ainda que  tardia! Dia 21 é feriado, para nossa alegria... aproveite para refletir. Ponha para fora esse grito mineiro que existe no peito de cada brasileiro. Arrebente as correntes da sua alma sejam elas quais forem. Vem liberdade. Nos cubra com suas asas. Estenda a bandeira de Minas na sua casa e no seu sorriso e mostre para todos que podem se aproximar, porque aí existe um amigo disposto a lutar por liberdade...

quinta-feira, 12 de abril de 2012

ENTRE BULAS E GUITARRAS

Essa semana, durante uma audiência conversava com um colega advogado e fiquei encantado enquanto ele me contava da sua coleção de guitarras, violões e outros instrumentos musicais. Fiquei imaginando a beleza de uma coleção dessas que segundo ele já tem mais de duzentas peças.
Eu que nunca tive a paciência de ser um bom colecionador juntei poucas coisas na vida. Mas uma sempre atiçou o meu interesse: bula de remédio. Fui obervando os detalhes engraçados de cada uma e comecei a juntar todas. É claro que o fato de ser hipocondríaco ajudou muito nisso. Basta que eu veja uma doença nova nos jornais e imediatamente começo a sentir todos os sintomas.

Mas minhas esquisitices a parte, as bulas são mesmo uma coisa interessante. Contam que as primeiras bulas, sem o controle que existe hoje, com a finalidade de vender os medicamentos contavam tantas vantagens mentirosas do produto que eram uma verdadeira propaganda abusiva. Daí surgir a expressão que ainda hoje se usa “fulano é mais convencido que uma bula de remédio”.  Não foram poucas as bulas que descreviam esses santos remédios que serviam para curar frieira, espinhela caída, impotência sexual e outros diversos males do corpo.

A palavra bula vêm do latim “bulla” que quer dizer bola ou esfera e foi primeiramente usada para descrever as mensagens do vaticano que vinham seladas com uma esfera com o símbolo papal. Como tempo outros documentos, entre eles os descritivos de remédio também passaram a serem chamados bula.

Sempre tive curiosidade de conhecer quem desenvolvia várias pérolas de textos de bula “O produto é bem tolerado, podendo causar dores de cabeça, edema, fadiga, sonolência, náusea, dor abdominal, rubor, palpitações, tonturas, alopecia, função intestinal alterada (porque uma bula não poderia mencionar caganeira, com o perdão da palavra), artralgia, astenia, dispepsia, dispneia, hiperglicemia, hiperplasia gengival, ginecomastia, impotência (gente, o cara pode ficar brocha tomando essa coisa), aumento da frequência urinária, leucopenia, mal estar, mudança nos humores”. Nada foi inventado. Fico só imaginando como seria se o produto fosse mal tolerado. Fala se não dá vontade de enquadrar uma maravilha dessas. Realizem a cena: “Dr. Meu irmão tomou o remédio e matou a esposa”, “mas a bula era clara que podia haver mudança de humores, não reclame.”

Bula também é lugar de poesia “como efeito do excesso medicamentoso, o paciente pode evoluir para o “exitus letalis”. Olha que linda maneira de dizer que o sujeito pode morrer. O departamento jurídico resguarda o produto sem precisar dizer que o cara pode bater as botas. Não é poético? É muito melhor ter “exitus letalis” do que morrer.

Sinto uma vez ter perdido várias de minhas preciosas bulas, algumas em inglês francês e italiano. Mas vamos recompondo a coleção. Entre bulas e guitarras, o que não vale é colecionar amarguras e rancores. Essas coisas a gente vai deixando pelo caminho...

Quem canta seus males... espanta!

               Eu estava atravessando o centro da cidade esses dias para comprar um cartão de aniversário. Quando passei na porta de um banco, havia uma senhora de fartas formas que exclamava sentida com cara de tristeza: “Aii vida!”. Chamou-me a atenção porque na volta quando passei por ali novamente ela fez a mesma coisa com a mesma cara de tédio: “Aii vida”. Fiquei pensando em quantas pessoas chatas que conheço que não sabem fazer outra coisa senão reclamar da vida. Aí não tem jeito mesmo. A pessoa vira uma chata. O Oswaldo Montenegro fala que chato é aquele que quando a gente pergunta “tudo bem?” a pessoa responde reclamando. O Millor dizia que “o chato é aquele que conta tudo tim tim por tim tim e depois ainda entra em detalhes”.
                Senhores chatos, pensei muito na solução dos seus problemas e apresento modesta solução: cantem! A música é majoritariamente definida como uma combinação de sons e silêncio seguindo uma pré-organização ao longo do tempo. Desde os primórdios há fortes indícios que já se faziam músicas. O homem das cavernas, em combinações de sons e danças, reverenciava os deuses e dava à música um forte sentido religioso. Desde aí já vem essa ideia de cantar para espantar o mal.
                Poucas coisas como a música mexem tanto com a alma. A própria palavra, que tem origem no grego, quer dizer a arte das musas, ou seja, vai envolver diretamente inspiração. Afinal, o passarinho canta porque é feliz ou é feliz porque canta? Tenho a impressão de que a segunda frase é a verdadeira.
                Música meus senhores! Cantem minhas Senhoras! Não importa a situação, ela vai bem em festas, passando por rituais religiosos e chegando a funerais.Dom Quixote, o próprio cavaleiro da triste figura, quatrocentos anos atrás já falava que é preciso cantar para espantar os males. E Dom Quixote larga tudo e vai pelo mundo buscando fazer justiça. Não se importava com a opinião dos outros e seguia em frente, mesmo após críticas e fracassos, porque estava seguro dos seus objetivos.  Olha que lindo!
                Cantem meus queridos! Espantem seus males! Mas muito cuidado pra não ficar cantando seus males e espantando todo mundo. Quem sabe você não arrisca até uma dancinha? Comece com dois pra lá dois pra cá, depois tente um Kuduro. Que essa semana seja cheia de coisas boas. Nada de “aii vida”. E terminamos com o mestre Chico: “ Não chore ainda não que eu tenho um violão e nós vamos cantar, felicidade aqui pode passar e ouvir e se ela for de samba há de querer ficar...”